O que sabemos de nós mesmo sem Todo o calor que me falta? Ramon Gonçalves nos lança a mais enigmaticidade no símbolo indecifrável do Coyocán, sob a luz de Vênus em áries. Ramon reivindica que pensemos o homem em seu deserto metafísico, então acalmemos os ânimos, estamos em um território selvagem e escuro. Comecemos nossa análise.

Coyoacán, da série "Todo o Calor que Me Falta" (2014) - Ramon Gonçalves

Pensemos! O que é o homem que pensa? Será uma amigável ovelha como no evangelho ou um lobo da estepe fadado em viver sua solidão? A solidão do lobo é silenciosa e noturna. Que terrível é a vida do lobo que não segue nenhum pastor, porém não se pode negar que é uma vida excitante. Nenhum cão que acompanha o pastor se iguala ao lobo, porque o lobo é selvagem, ele uiva ao viver a noite.

A solidão do lobo não quer dizer que ele seja a ovelha desgarrada, a solidão não excluí os demais, somente é a sobriedade enquanto as ovelhas dormem. O lobo uiva para lua, contemplando todos astros que está além dele, a busca astrológica de ir onde não se sabe. Na sua sobriedade, sabe que está a volta de algo que o ultrapassa. Seu uivo-lírico é trazer o enigma para a linguagem.

O lobo chora da impossibilidade de não tocar a lua, mas é da sua lágrima fervente que ela dissolve e se apropria, é seu uivo-lírico que torna a noite silenciosa. Todo o calor que falta é do âmbito do desconhecido, do ser indeterminado. Falta algo no ente do ser, mas o quê não se sabe, porque é noite.

O lobo é amante da Lua, pois tudo o que é do oculto é excitante. A noite esconde o mistério da fertilidade. Como algo pode se transformar em outro? Creio que só a mulher seja capaz de entender o enigma de vênus em áries. A lua e a mulher são esfinges encarnadas. Quando a mulher é minguante, a lua revela o mistério da mama.

O homem é o lobo do homem, e nisso consiste mais elogio a virtude do animal do que ao próprio homem que teme o pensamento. Terríveis mesmo são todos os pensadores que temem a noite, imitam os antigos  pois não conseguem pensar em sua solidão. Silêncio, na noite o fluxo não é de dentro, nem fora, nasce a partir de si mesmo.

Darlon Silva,
Poeta.

da série "Todo o Calor que Me Falta"

a direita; série de Ramon Gonçalves apresentada na EM México