obra de Maurício Teixeira, exposta na exposição "Tanta Imensidão"

Em “Mundo das Águas”, Maurício Stone capturou o último suspiro da água, a ferocidade de um mundo rodeado de vulcões em erupções, o chão seco, o Deus desfigurado, o céu em sangue, a anarquia, o ser para a morte, metal em fusão, as artérias volumosas, o segredo do salto mortal, estado de guerra e tudo que cause fervor a nossa civilização escaldante.

A agonia da água diante ao vulcanismo industrial não é o mesmo sentimento de erupção das lavas na lei natural, mas talvez seja um apelo ao céu escuro por inundação, que assim se destrua e volte a ser, retroceda. O vulcão ativo em questão na verdade é a anarquia da nossa civilização, que burlou com todas as erupções dos divinizados elementos da natureza. O vulcão pintado tem a mesma forma retangular das indústrias que expelem gases poluidores ao ar e secam a vida dos rios com seus imundos dejetos.

De uma erupção nasceu o homem civilizado, que antes não sabia o que era o poder de manipulação do ferro. Muito provavelmente a metalurgia, que originou a história da civilização, tenha surgido com o vômito de algum vulcão e depois o homem imitou com outros meios. O vulcão ensinou segredos ao homem, e eles perverteram a ideia em agricultura desenfreada e fabricação de armas bélicas. Esse foi o primeiro passo para a institucionalização da propriedade exagerada de alguns e de todas as viciosas vaidades.

O rosto da água anuncia a morte, e quase todo o corpo já está derretido pelo calor do magma, que já desce do cume da montanha secando o chão, acompanhado de muito fogo e negras fumaças, como nas chaminés das indústrias. No “Mundo das Águas” o chão é seco, tudo é quente, sanguíneo e colérico, contrariamente o nome do mundo, que é dado pela nítida falta e não pela central presença do azul, da fleuma. O céu é negro e contaminado de chuva ácida.

A boca entreaberta parece gritar ao quente de todo o vermelho da tela. O vermelho da lava e também do céu carregados de nuvens negras. A boca e as nuvens indicam a chuva torrencial que esta para acontecer. Grande chuva pressagia inundações planetárias e esquecimento de um mundo antigo, perturbado pelo mau uso do segredo revelado pelas calorentas veias anárquicas da terra, e das feridas insecáveis de um mundo enfermo.

Em Mundo das Águas, Maurício pretende cicatrizar esse mundo – recorre à água para lhe purificar. A inundação que esta preste a ocorrer purificará todas as desmedidas de nossa civilização. No céu obscurecido, há uma forte presença da água em potência, onde o retorno às origens da lei natural será possível pela rebeldia da chuva. Quando a última gota do céu cair, a trovoada cessar e a terra seca se tornar mar, o absoluto estará de volta, os vulcões dormirão, até a chegada de um novo jovem anarquista como este.


Darlon Silva,
Poeta.

o artista em frente ao díptico "Mundo das Águas"